- A COR DO INVISÍVEL -
A CASA EM RUÍNAS
Uma única porta
No único muro de uma casa em
ruínas.
Cuidado... Quem atravessar
essa porta, à noite,
Pode
ficar para sempre no Outro Mundo!
A MULHER BIÔNICA
Para Lindsay Wagner
Eu quero uma mulher biônica
Que me ame como uma
suspirosa máquina
Do mais intenso amor.
Uma mulher que quase me
mate...
Mas me livre de todos os
ataques!
Eu quero, eu quero uma
mulher biônica
Para que eu possa, a
qualquer momento,
Desparafusá-la...
REZAS
Rezas da infância, tão
puras...
Um dia a gente as esquece!
Mas o bom Deus, das alturas,
Ainda
escuta a nossa prece...
A VERDADEIRA ARTE DE VIAJAR
A gente sempre deve sair à
rua como quem foge de casa,
Como se estivessem abertos
diante de nós todos os caminhos
[do mundo...
Não importa que os compromissos,
as obrigações, estejam
[logo ali...
Chegamos de muito longe, de
alma aberta e o coração
[cantando!
LEITURAS
Tenho alergia a esses
romances que se passam dentro dos
[transatlânticos
Em alto-mar...
Como é que os seus
figurantes não acabam jogando-se pelo
[tombadilho,
Fartos
de verem as caras uns dos outros?!
INSCRIÇÃO PARA UM PORTÃO DE CEMITÉRIO
Na mesma pedra sem
encontram,
Conforme o povo traduz,
Quando se nasce, – uma estrela,
Quando se morre, – uma cruz.
Mas quantos que aqui
repousam
Hão de emendar-nos assim:
“Ponham-me a cruz no
princípio...
E
a luz da estrela no fim!”
DETRÁS DE UM MURO SURGE A LUA
Detrás de um muro surge a
lua. Em frente
acendem-se os lampiões. A
noite cai.
Na praça a banda toca de
repente
Um
samba histérico... Aflições, dançai!
Mas qual! Meu coração triste
e indolente
Olha sem ver, de tudo se
distrai...
Que pena faz uma criança doente!
Como
ele está! Cada passito é um ai...
Vai morrer atacado de si
mesmo,
Dos longos poentes que
passou a esmo,
A
embebedar-se de Cinzento e Roxo.
E enquanto a Vida corre – ó Mascarada!
Ele abre, vagamente, sobre o
Nada,
O
seu olhar sonâmbulo de mocho!
ANOITECER
Da chaminé da tua casa
Uma por uma
Vão
brotando as estrelinhas...
O RIO
A morte é um rio onde a
gente
Embarca de olhos fechados
Se queres partir contente
Nada deixes deste lado.
É deste lado de cá
Que moram nossos cuidados,
Penas que amor nos deixou
São penas que o vento trouxe
São pelo vento levadas.
Fecha os olhos bem fechados
Basta de tanta rima em “ados”
Dorme o teu sono profundo
Longe, cada vez mais longe
Deste
mundo e seus cuidados.
*
* *
(“A
Cor do Invisível”, 2ª Edição, Editora Globo, SP, 1994)
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