MAGIAS
Conheço
uma cidade azul.
Conheço
uma cidade cor de ferrugem.
Na
primeira, há helicópteros pairando...
Na
segunda, espiam de seus esconderijos os olhos das ratazanas...
No
entanto
é a
mesma cidade
e,
onde
a gente estiver,
será
sempre uma alma extraviada em labirintos escusos
ou,
então,
uma
alma perdida de amor...
Sim! por
ser habitado por almas
é que
este nosso mundo é um mundo mágico...
onde
cada coisa – a cada passo que se der
vai
mudando de aspecto...
de
forma...
de
cor...
Vai mudando de alma!
TORRE
AZUL
É
preciso construir uma torre
– uma
torre azul para os suicidas.
Têm
qualquer coisa de anjo esses suicidas voadores,
qualquer
coisa de anjo que perdeu as asas.
É
preciso construir-lhes um túnel
– um túnel
sem fim e sem saída
e
onde um trem viajasse eternamente
como uma nave em alto mar perdida.
É
preciso construir uma torre...
É
preciso construir um túnel... É preciso morrer de puro,
puro amor!...
NOTURNO
I
O
corpo adormeceu no leito.
A alma baixou às cavernas.
Da
alta lucerna, o espírito
vidente e astrólogo, espreita.
E a
alma descobria estrelas
do
mar, velhas escadas, caracóis de cabelos,
coisas
estranhas no tempo perdidas
e
tantas – que pareciam, elas,
naufrágios
de mil e uma
vidas...
Porém
o
corpo
antes
que o Dia o recomponha
na
sua Humana e Divina Trindade,
o corpo – que não vigia e não sonha –
curte a sua animalidade!
DE
LONGE PARA LONGE
Embora
as vejas daqui,
dentro
deste mesmo ar,
as
velhas catedrais
estão
no fundo do mar,
cantando...
Vozes
de sinos ou de preces
– é da
tua alma que elas,
às vezes, surgem à tona...
E
esses velhos caminhos,
embora
os vejas daqui
– sabes aonde irão dar?
Caminhos
são mais antigos
que a
redondeza da terra.
Eles
não descem os horizontes...
seguem, sozinhos, no ar.
(E ai
dos caminhos que levam
de volta ao mesmo lugar!)
Dizem
que os deuses morreram?
Um
deus sempre está sepulto
para depois ressuscitar...
Viemos
do fundo do mar,
no entanto, estamos na Lua...
Mas como se há de parar?
(Homens,
sementes ocultas
cujo sonho é germinar...)
E
àquele que um dia foi
do antigo Jardim expulso
ofertaremos
os frutos
da Grande Árvore Estelar.
DEIXA-ME
SEGUIR PARA O MAR
Tenta
esquecer-me... Ser lembrado é como
evocar-se
um fantasma... Deixa-me ser
o que sou, o que sempre fui, um rio que vai
fluindo...
Em
vão, em minhas margens cantarão as horas,
me
recamarei de estrelas como um manto real,
me
bordarei de nuvens e de asas,
às vezes virão em mim as crianças
banhar-se...
Um
espelho não guarda as coisas refletidas!
E o
meu destino é seguir... é seguir para o Mar,
as
imagens perdendo no caminho...
Deixa-me fluir, passar, cantar...
toda
a tristeza dos rios
é não poderem parar!
ESPANTOS
Neste
mundo de tantos espantos,
Cheio
das mágicas de Deus,
O que
existe de mais sobrenatural
São os ateus...
* * *
(“Baú de Espantos”, 4ª Edição, Editora
Globo, RJ,1988)
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