Quando abro cada manhã a janela do meu quarto
É como se abrisse o mesmo livro
Numa página nova...
Primavera
As águas riem como raparigas
À sombra verde-azul das samambaias!
Lembras-te?
Minha lanterna andante, meu cachorrinho de cego...
Perdidos naquela Babilônia, nem sei bem se eras o caminho...
Se, acaso, eras a verdade...
Eu sei apenas que Tu és a Vida!
Jardim Interior
Todos os jardins deviam ser fechados,
Com altos muros de um cinza muito pálido,
onde uma fonte
pudesse cantar
sozinha
entre o vermelho dos cravos.
O que mata um jardim não é mesmo
alguma ausência
nem o abandono...
O que mata um jardim é esse olhar vazio
de que por eles passa indiferente.
À Maneira de Jacques Prévert
Um homem de visão com uma mulher de vison
Um homem público e uma mulher pública
A poluição diurna e as poluções noturnas
O rabo do olho num rabo de saia
Um gato escaldado e um cachorro quente
Um tigre de Bengala e um gato de guarda-chuva.
Magias
Os antigos retratos de parede
Não conseguem ficar por longo tempo abstratos.
Às vezes os seus olhos te fitam, obstinados,
Porque eles nunca se desumanizam de todo.
Jamais te voltes para trás de repente:
Poderias pegá-los em flagrante.
Não, não olhes nunca!
O melhor é cantares cantigas loucas e sem fim...
Sem fim e sem sentido...
Dessas que a gente inventava para enganar a solidão dos caminhos sem lua.
(“A Cor do Invisível” – Ed. Globo, 1994)
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