* * *
A coisa mais natural da vida é a morte;
A
coisa mais absurda da vida é a própria vida.
O ETERNO CRISTO
O povo adora e vive suspirando por um
Messias,
Que o venha libertar de tudo no mundo,
Mas quando esse Dia Santo
Chega afinal,
Todos os seus crentes, cheios de espanto
e medo,
A
única coisa que conseguem fazer é apedrejá-lo!
MADRIGAL
Tu és a matéria plástica de meus versos,
querida...
Porque, afinal,
Eu nunca fiz meus versos propriamente a
ti:
Eu
sempre fiz versos de ti!
ESTE NOSSO MUNDO
Sentiu Adão que alguém se aproximava
silenciosamente
E lhe tapava os olhos com carinho!
”Adivinha quem é, meu queridinho?!”
Quem mais podia ser senão a sua doce, a
sua querida Evinha?
Adão sorriu com aquela brincadeira.
Voltou a sorrir-se para ela... Mas não:
A voz que ouvira não era dela, mas a voz
sinuosa da Serpente,
Que acabara de devorar a maçã e a
própria Eva!
E desde então ele ficou sem companheira
para nada
E teve, até agora,
De fazer tudo pela própria vida
Neste
mundo do Diabo!
LIBERAÇÃO
Que bom deveria ser o
mundo antes do nascimento de Cristo
E da Rainha Victória!
A única esperança que
nos resta é a desse novo século que aí vem,
Liberto, sem injunções de espécie alguma.
O NOME E AS
COISAS
Para que estragar a
simples existência das coisas com nomes arbitrários?
Um gato não sabe que
se chama gato
E Deus não sabe que
se chama Deus
(“Eu sou quem sou” –
diz Ele no livro do Gênesis)
Eu sonho
É com uma linguagem
composta unicamente de adjetivos
Como deve ser a
linguagem das plantas e dos animais!
Só de adjetivos, sem
explicação alguma,
Mas com muito mais poesia...
ESTRANHEZA
Os vivos e os mortos
Sempre tivemos uma
coisa em comum:
Não acreditamos muito uns nos outros...
DA
IMPARCIALIDADE
O homem – eternamente
escravo de suas paixões pessoais –
É absolutamente
incapaz de imparcialidade.
Só Deus é imparcial.
Só Ele é que pode,
por exemplo,
Abençoar, ao mesmo
tempo,
As bandeiras de dois exércitos inimigos que vão entrar
em luta...
* * *
Os psicanalistas,
como o caso deles me preocupa!
Eles próprios sofrem
de um dos mais terríveis complexos do mundo,
Que é o complexo dos
complexos.
Ah, se a gente
pudesse ter uma simples e amistosa conversa com eles,
Sem que descubram
coisas por trás!
E se, por acaso,
Tombar um ovo choco
no chão,
Por que hei de ser um
maníaco homicida,
Um fabricante de
anjinhos?!
Por que não vão eles
inquirir sobre isso o próprio Acaso,
Que não sabe de nada...
NOS SOLENES
BANQUETES
Nos solenes banquetes
de próceres internacionais
– em especial sobre
desarmamentos –
O aparte mais
espontâneo
É o riso de prata de
uma colherinha
Que por acaso tombou no chão!
* * *
(“Velório sem defunto” – Ed. Mercado Aberto, 1990)
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