Um morcego enormíssimo escureceu metade da cidade – uma nuvem negra, imóvel.
Tivemos de as procurar às pressas e ir acendendo as velas com mãos trêmulas como se as erguêssemos diante de oratórios.
E diante delas as nossas tataravós ajoelham-se penosamente, babando misereres.
Súbito, restabeleceu-se a eletricidade, desmoralizando a anemia das velas.
Das tataravós, nem sombra!
Elas agora devem estar rezando em qualquer um desses mundos por aí, diante de algum outro falso fim-do-mundo.
As moças das cidades pequenas com o seu sorriso e o estampado claro de seus vestidos são a própria vida.
Elas é que alvoroçam a praça. Por elas é que os sinos festivamente batem, aos domingos. Por elas, e não para a missa!...
Mas Deus não se importa...
Afinal, só nessas cidadezinhas humildes é que ainda o chamam de Deus Nosso Senhor...
As grandes damas usavam grandes chapéus, cheios de flores e de passarinhos.
As flores feneceram, porque até as flores artificiais fenecem.
Os passarinhos voaram e foram pousar nos últimos parques, onde iludem agora os seus últimos freqüentadores.
Sim! As grandes damas usavam grandes chapéus...
Eram cheios de flores e de passarinhos!
(“Esconderijos do Tempo” – L&PM Editores, Porto Alegre, 1981)
Nenhum comentário:
Postar um comentário